quinta-feira, 12 de abril de 2012

Contando histórias - à moda dos antigos Mestres gnósticos


O SAPATEIRO INTELIGENTE



            O Mestre havia combinado com os alunos que a cada dia  escolheriam o local onde estudariam, pois ele dizia que todos os lugares e ocasiões são espaços de aprender. Naquele dia era noite e chovia bastante e os discípulos tardavam em chegar, pois moravam distante e o local escolhido naquela noite  ficava em um lugar de difícil acesso.
            A chuva caía forte e as condições ainda eram precárias, quando todos chegaram à gruta. Sem que houvessem combinado quem teria a palavra aquele dia, Nicolau, o jovem turco aproximou-se da fogueira que haviam construído  e iniciou o diálogo:

  ___A que se assemelha o trabalho e a oração? E contou uma estória.  

Era uma vez um homem que sempre ia buscar água na fonte com um cântaro e  que era um sapateiro. Quando voltava com o seu cântaro cheio de água, ia para oficina e fazia lindos sapatos, de todos os tipos e tamanhos. Seus sapatos eram conhecidos em muitos lugares porque eram feitos com muita perfeição. Até para vendê-los ele procurava fazer algo diferente. Sempre que um modelo novo era reproduzido, ele pegava um par, as vezes dois, dependia da quantidade produzida,  e  ao invés de ir direto par casa, ia pelas redondezas da cidade olhando a tudo e deixava os sapatos  em algum lugar do caminho.Um dia os aprendizes da fábrica ficaram curiosos e o seguiram e voltaram sem entender, pois ele deixou os sapatos na estrada  e voltou para casa.      

No dia seguinte perguntaram a ele porque fazia daquela forma e ele respondeu:

____É  que faço meu trabalho de sapateiro com amor  e o amor é um caminho, que precisa  ser compartilhado por muitos. Então inventei esta forma, e sempre que faço um sapato, eu penso em quem paga para usar e no sapato que vou dar, para que digam do fundo do coração:

_____Abençoado  o sapateiro que fez estes sapatos!  Assim  fazendo acrescento valor ao meu trabalho, tenho testemunhas do que faço  e só então eu me dirijo ao templo e apresento os meus pedidos  a Deus.


            Quando Nicolau - o turco - terminou a história, a chuva também tinha passado e todos se levantaram e saíram conversando. Um a um foram saindo da gruta, levando consigo  a idéia do trabalho inteligente. Só o Mestre ficou e em silêncio. Olhou a gruta, o chão e o teto, abstraiu o céu e as estrelas e viu a gruta em cada oficina e a oficina em cada templo. Fechou os olhos para cochilar um pouco, um cochilo rápido, porque ele ainda tinha muito que fazer e ainda não havia chegado o sétimo dia. 
(escrito  por Regina Moraes - para o Shemá - Filosofia Gnóstica)

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